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Informação profissional para a indústria metalomecânica portuguesa
“A indústria de moldes vai beneficiar com a transição energética da indústria automóvel”

Entrevista com Wilfried Schäfer, diretor executivo da Associação Alemã de Fabricantes de Máquinas-Ferramentas (VDW)

Luísa Santos10/07/2023

Depois de um longo interregno devido à pandemia, a EMO volta a Hanôver de 18 a 23 de setembro de 2023. Sob o lema 'Innovate Manufacturing', a principal feira mundial de tecnologias de produção - e a única onde só podem participar fabricantes – oferece aos visitantes mais de 180 mil m2 repletos de inovações tecnológicas. Wilfried Schäfer, diretor executivo da Associação Alemã de Fabricantes de Máquinas-Ferramentas (VDW), organizadora do evento, está otimista em relação à edição deste ano e ao futuro da indústria transformadora na Europa. Nesta entrevista, explica-nos porquê.

Wilfried Schäfer, atual diretor executivo da Associação Alemã de Fabricantes de Máquinas-Ferramentas (VDW)...

Wilfried Schäfer, atual diretor executivo da Associação Alemã de Fabricantes de Máquinas-Ferramentas (VDW), aponta a digitalização como a principal tendência do setor.

A EMO regressa passados quatro anos. Qual é a vossa expectativa para a edição deste ano?

Temos a perceção de que, depois da pandemia, as empresas estão muito interessadas em mostrar as suas soluções em feiras profissionais. E esta perceção decorre não apenas da preparação da EMO, nem apenas da parte dos nossos associados, mas de contactos tidos com empresas de várias áreas produtivas.

Aliás, a associação alemã de feiras profissionais divulgou recentemente um estudo que revela que, nos negócios B2B, as feiras profissionais ainda são a principal ferramenta de marketing das empresas. Por isso, estamos muito otimistas em relação a esta próxima edição da EMO.

O slogan da EMO 2023 é 'Innovate Manufacturing'. Que aspetos abrange esta frase?

Tratando-se da feira líder do nosso setor, a nível mundial, é natural que os visitantes tenham a expectativa de encontrar na EMO as mais recentes inovações nas diversas gamas de produtos. Como referiu o expositor português Palbit, durante a apresentação da EMO em Portugal, para que a participação na feira seja bem-sucedida, é essencial apresentarmos inovações. É isso que os seus potenciais clientes de todo o mundo esperam encontrar.

A sustentabilidade é um dos temas da feira. Como é que os fabricantes podem ter uma atividade mais sustentável e que papel têm as máquinas-ferramenta neste processo?

A máquina desempenha, naturalmente, um papel central nesta questão. Há alguns anos atrás, um estudo elaborado pela VDW revelou que o principal aspeto que influencia a sustentabilidade do processo de maquinagem é a eficiência energética. Claro que, dependendo dos processos, e de eventuais novas estruturas dos mesmos, também podemos conseguir eficiência no uso dos materiais, na otimização de processos, com menos resíduos, e no uso adequado de refrigerante, por exemplo.

Se considerarmos a máquina, a linha de produção e a totalidade da fábrica, onde se incluem as mais variadas tecnologias, a sustentabilidade pode passar, por exemplo, pela redução do consumo de ar comprimido, que normalmente representa um gasto de energia significativo. Por outro lado, a recolha e análise de dados, em tempo real, de toda a linha de produção desempenha um papel fundamental neste caminho, já que permite encontrar as melhores opções para a otimização de processos.

“Os visitantes esperam encontrar na EMO as mais recentes inovações nas várias gamas de produtos e é isso que lhes oferecemos”

A digitalização é essencial para sabermos onde estão as ineficiências do processo…

Sim. E a abrangência vai além do chão de fábrica. Para garantirmos a sustentabilidade de todo o processo operativo, temos de ter em conta não apenas as máquinas e a linha de produção, mas todo o edifício. A instalação de fontes de energia renováveis, como painéis solares, nas fábricas é uma das medidas possíveis para alimentação das máquinas. Tal como os permutadores de calor, que permitem usar o calor gerado durante o processo produtivo para aquecer o ambiente. Do mesmo modo, para arrefecer algo, podemos usar fontes de frio que estejam previamente presentes no processo, sem necessidade de gastar recursos em equipamentos de arrefecimento adicionais.

Resumindo, a otimização de processos com vista à sustentabilidade passa necessariamente pela interligação entre o edifício, a linha de produção e a máquina.

Há poucas semanas soubemos que a queda de encomendas de máquinas-ferramenta na Alemanha começou a abrandar. Isto, apesar das condições adversas que vivemos. Na sua opinião, este pode ser um ponto de viragem?

Neste momento, a nossa expectativa é exatamente essa. Da perspetiva dos fabricantes de máquinas-ferramenta, a quantidade de pedidos em espera do ano passado ainda é elevada, o que, no primeiro trimestre, se traduziu numa diminuição da faturação, com um aumento da produção em simultâneo. Isto porque tivemos muitas encomendas que coincidiram com falhas na cadeia de abastecimento. Nesta fase, as empresas estão a trabalhar arduamente para completar as encomendas e a nossa expectativa é que, na segunda fase do ano, a procura volte a aumentar.

Que fatores contribuem para essa perspetiva positiva?

Por um lado, os crescentes requisitos de sustentabilidade impostos pela sociedade, que estão a operar mudanças na indústria automóvel, com novos modelos em vista. Por outro lado, as grandes mudanças que se avizinham na produção de energia. Com o Green Deal, vamos ter de aumentar bastante a produção de energia eólica e de hidrogénio, por exemplo. E não apenas na Europa. Vemos grandes investimentos em energias limpas nos EUA, por exemplo, e isto representa um grande impulso para a produção mundial.

O mercado automóvel continua a ter o mesmo peso nas vendas de máquinas-ferramenta que tinha antes da pandemia? Ainda é o principal setor cliente?

Sim, mas já não com uma diferença tão significativa em relação a outros setores, como o da maquinaria geral, que representa atualmente 30% das vendas de máquinas alemãs. O automóvel continua a ter um peso mais elevado, mas pouco, dependendo do segmento (automóveis de passageiros ou outros veículos). Por outro lado, houve um crescimento em outros setores, como o aeroespacial, o ferroviário e o médico.

Como espera que o mercado automóvel evolua nos próximos meses?

A procura por parte dos consumidores tem vindo a aumentar e é uma procura com requisitos ambientais importantes. Por isso, acho que vamos assistir a um crescimento nas vendas de veículos elétricos, não apenas na Europa, onde países como a Noruega estabeleceram o objetivo claro de acabar de vez com os veículos de combustão até 2035, mas também em países como a China que, atualmente, produz mais carros elétricos que a Europa e os EUA.

De que forma é que a eletrificação automóvel influencia o setor das máquinas-ferramenta e setores cliente como o dos moldes?

A fase mais complicada que a indústria de moldes viveu nos últimos anos teve a ver com a falta de renovação de modelos com motores de combustão, numa altura em que os novos modelos elétricos ainda não tinham sido lançados. Mas, na verdade, para a combustão em si não precisamos de moldes. Precisamos, sim, para o interior dos automóveis e, nesse aspeto, os novos modelos elétricos têm tantas ou mais peças de design que os de combustão. Por isso, a indústria de moldes e matrizes não vai sofrer com esta transição, pelo contrário, vai beneficiar.

Já no que respeita aos fabricantes de máquinas-ferramenta que têm estado muito focados em tecnologias para produzir peças para automóveis de combustão, terão de usar o seu conhecimento tecnológico para trabalhar outros segmentos cliente, ou encontrar novas soluções. Algumas destas empresas já fizeram esta adaptação e, inclusive, mudaram o tipo de máquina que fabricam. Deixaram de produzir máquinas de corte para produzir linhas de montagem para packs de baterias, por exemplo. Basicamente, utilizaram as competências de automação que já tinham e aplicaram-nas numa nova área. Claro, com muito trabalho de desenvolvimento envolvido.

Qual é o balanço comercial entre Portugal e a Alemanha, no que respeita à venda de máquinas-ferramenta?

Em 2022, as exportações de máquinas-ferramenta (incluindo peças e serviços) alemãs para Portugal atingiram os 55,9 milhões de euros. Já as importações de equipamentos, peças e serviços portugueses para a Alemanha totalizaram três milhões de euros, um número ligeiramente inferior aos de 2020 e 2021 (3 milhões de euros, em ambos os anos).

Como sempre, durante a EMO, os visitantes poderão ver equipamentos em funcionamento numa vasta gama de aplicações...
Como sempre, durante a EMO, os visitantes poderão ver equipamentos em funcionamento numa vasta gama de aplicações: em sistemas de montagem e alimentação de peças, inspeção, medição, eletrónica industrial e muito mais.

Gostaria de salientar algum fator particularmente relevante para a indústria portuguesa?

Existe uma relação muito estreita entre Portugal e a Alemanha, quer comercial quer em transferência de tecnologia. Mas acho que seria vantajoso tentarmos encontrar também uma forma de cooperação no que respeita à formação de mão de obra qualificada. Deveríamos procurar desenvolver uma solução europeia para este problema. Na Europa, temos as melhores capacidades. Por isso, primeiro, precisamos de saber exatamente quais são as necessidades das empresas e, a seguir, deveríamos cooperar muito ativamente na qualificação dos trabalhadores da produção industrial. Convidamos todos os interessados neste tema a visitar a EMO para discutir este tópico.

A feira terá um stand especial do instituto alemão ‘Youth Foundation for Mechanical Engineering’, que terá como um dos temas principais ‘new learning concepts’ (novos conceitos de aprendizagem). O objetivo é passar às empresas, aos professores de instituições de ensino técnico e de centros tecnológicos novas ferramentas de ensino e novos conteúdos, que favoreçam a formação de profissionais para a indústria produtiva.

A nossa congénere em Espanha, a AFM, é um bom exemplo. Tem a sua própria unidade de ensino, onde dão formação desde a especialização técnica até ao bacharelato e mestrado. Mas há mais a fazer noutros pontos da Europa. Eu acredito que, se conseguirmos juntar na EMO professores de centros deste tipo de todo o continente e outros interessados neste tema, conseguimos encontrar melhores soluções para este importante tópico.

Quais são as principais tendências atuais do setor?

A digitalização é a grande tendência do setor. E não estamos a falar apenas das máquinas ou da linha de produção, mas também do próprio modelo de negócio das empresas, que deve ser cada vez mais digital, e de toda a cadeia de valor.

Hoje, já temos disponíveis ferramentas de IIoT que nos oferecem uma grande quantidade de dados essenciais para a boa gestão da produção. Implementá-las é um passo importante para a digitalização dos processos empresariais. No entanto, há que ter em conta que estes sistemas exigem atenção redobrada no que respeita à cibersegurança. Este tema será abordado em detalhe na EMO.

No chão de fábrica, ferramentas como a realidade aumentada e os gémeos digitais estão a ser implementadas para ajudar as empresas a acelerar processos e prever eventuais falhas antes delas acontecerem.

Mas, para conseguirmos conectar as máquinas e todas estas ferramentas digitais, precisamos de uma linguagem de produção global. A interface universal umati, lançada na última EMO, nasceu para responder a esse desafio. Baseada em OPC UA, conta já com mais de 300 empresas aderentes e estará em grande destaque na feira, com diversas demonstrações ao vivo.

A generalização do uso de cobots na indústria é outra das tendências. Durante a EMO, os visitantes poderão ver estes equipamentos a trabalhar num grande número de aplicações: em sistemas de assemblagem e alimentação de peças, inspeção, medição, eletrónica industrial, e muito mais.

Para terminarmos, os fabricantes têm investido muito em automatização de processos, mas a verdade é que a procura de mão de obra não para de aumentar. Como comenta este facto?

A falta de mão de obra atual decorre de um ‘gap’ geracional que tem de ser preenchido. A crescente automatização de processos acontece exatamente para colmatar essa lacuna e, portanto, é natural que continue a aumentar. Na EMO 2023, as empresas vão poder encontrar um grande número de soluções para esse efeito.

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